Cuidar é acolher fragilidades e oferecer colo

Quando cuidamos de pessoas idosas talvez uma das maiores dificuldades seja o ato de reaprender a conviver com um adulto que a vida inteira foi sua referência. A pessoa que você procurava quando estava inseguro.

 Que você buscava quando precisava tomar uma decisão difícil, de apoio moral e financeiro, de colo. Mesmo que você não tivesse coragem de pedir um colo. Só de estar perto dela já era reconfortante. Pois parecia que ela sempre adivinhava suas preocupações, mesmo sem você expressá-las e, sempre lhe dizia palavras reconfortantes e amorosas que clareava suas ideias.

Ou numa situação inversa, vocês tinham tantas ideias contraditórias que os diálogos eram acalorados, mas mesmo assim isso facilitava a sua tomada de decisões.

Verdade é que, na grande maioria das vezes nossos pais são nosso porto seguro. E quando somos jovens não conseguimos imaginá-los como seres frágeis e vulneráveis. Portanto, quando a velhice chega e se ela for generosa e chegar aos pouquinhos nós vamos nos adaptando aos poucos.

Mas, é possível que seu pai ou sua mãe torne-se um ser dependente para tudo por motivos de saúde. E quando isso acontece é como se tivéssemos levado uma rasteira da vida.

Precisamos mudar nossos projetos de vida. Além disso, da noite para o dia, as vezes precisamos ser o esteio da família. Tomar as decisões que antes seriam tomadas por nossos pais, é uma tarefa bem complicada. Administrar uma casa também não é fácil. E muitas vezes essas mudanças vem acompanhadas da diminuição dos recursos financeiros. Pois a pessoa que ficou doente era provedora.

Então nos deparamos com aumento das despesas, em virtude de médicos, medicamentos e fisioterapias e falta de recursos financeiros. Nos primeiros dias, dependendo do abalo emocional que sofrer toda a família a maioria estará por perto.

Mas à medida que se passam os dias, vem as semanas, depois meses e anos seguidos. A grande maioria volta para a rotina normal de suas vidas.

E, aos poucos a velhice se instaura e a cada dia o quadro de dependência torna-se maior. Mas quem não acompanha esse processo, desconhece o grau de cansaço e frustração que o cuidado cotidiano aos poucos vai gerando no cuidador.

Você tem um adulto que se comporta como uma criança, porém em segundos de vislumbres de consciência é adulto.

Os momentos de agressividade são bem difíceis, pois de repente seu pai ou sua mãe que quando você era criança nunca tinha lhe dado um tapa, pode hoje na velhice te deixar com hematomas.

É difícil contarmos as miudezas do cotidiano. Por mais que a pessoa já tenha perdido o controle do esfíncter é bem delicado o dia que você tenta sentá-la no vaso e ela já não sabe mais para que.

Nesse dia, a gente lembra de como foi o processo de ensinar nossos filhos a usarem o banheiro. Porém com nossos pais é um processo inverso.  Eles continuam adultos, e agora crianças. Então percebemos que eles precisam de colo e abraços reconfortantes igual aos que damos em nossos filhos.

Sei que eles nos xingam, nos mandam embora e são agressivos. Muitas vezes também estamos no nosso limite e também desejamos ir embora.

Nesses momentos, você tem a oportunidade de oferecer a eles aquele abraço, que eles não te ofereceram quando você era criança, adolescente ou jovem. Mas lembre-se eles também não receberam dos pais deles.

Faça a diferença hoje ao acolher e abraçar seu pai, sua mãe, ou a pessoa pela qual você se tornou responsável. Respeitando suas fragilidades e dores ao reconfortá-los.

Pois talvez a face mais cruel da velhice, seja o momento em que já não conseguimos mais cuidar do nosso corpo.

E se você não morrer jovem, poderá passar por ela também. 

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Kelem Cristina de Sene Santos
Kelem Cristina de Sene Santos
1 ano atrás

E como é difícil lidarmos com tantas situações que surgem e para as quais nem sempre conseguimos as soluções. Especialmente do ponto de vista emocional, pois sofre aquele que precisa ser cuidado e aquele que cuida.

Ana Maria da Silva
Ana Maria da Silva
Responder a  Kelem Cristina de Sene Santos
1 ano atrás

Eu entendo perfeitamente o que você está falando. Cada dia que passa aumenta muito mais a nossa responsabilidade em cuidar de nossos idosos e aumenta muito mais a necessidade de nós cuidarmos porque vai aparecendo tantas dores físicas e emocional em nossos corpos e alma .

Benice
Benice
1 ano atrás

Realmente Cicera não é fácil me vi nesse texto pois estou passando por esse momento cuidando minha mãe e bem isso as vezes fico chateada com ela quando me diz estou dando trabalho, peço a Deus me levar mas não leva vou ficando aqui, isso me dói tanto porque cuido com amor hoje tudo que faço e por ela e para ela, passo 2 dias fora casa já me preocupo, mas sinto tb que ela gosta de ficar só com o esposo, por isso fico fora mas não gosto dele cuidando acho que eu cuido melhor rsrs mesmo sabendo que ela quer ele cuidando. A vida é assim e nós como vc disse se não morrermos antes, seremos eles amanhã. Que Jesus tenha misericórdia de todos. Amém.

Tete Cunha
Tete Cunha
1 ano atrás

Obrigada por compartilhar. Meu pai passou por Alzeimer. Foi perdendo aos poucos a consciência. Não ficou agressivo. Era um ser que retribuía nossos sorrisos. Um dia fugiu de madrugada. Achamos ele ao meio dia. Uns 5 km de casa. Tiramos a chave da porta. O cuidadora foi minha mãe. Que por vezes se desdobrava pra dar conforto a ele. Todo cuidador precisa também se cuidar pra não perder a saúde e a sanidade. Depois que papai se foi minha mãe enfrentou um grande vazio. Por isso é importante não esquecermos que o cuidador precisa ser cuidado.

Um grande abraço

Fernanda das Neves
1 ano atrás

E por vezes acontece um filho idoso cuidando de um pai/mãe ainda mais idoso…