Meu filho teve um diagnóstico tardio do espectro autista, já tinha vivido mais de uma década quando eu recebi o diagnóstico, Pedro é autista. Eu já sabia que ele tinha síndrome doose, que era TDO, TDAH e tinha defasagem idade mental/ idade cronológica.
Claro que os sinais estavam lá, quando ele era pequeno e ganhava algum brinquedo eletrônico, enquanto ele ouvisse um barulho ele estava a desmanchar o brinquedo, suas roupas ainda hoje, precisam ser tiradas todas as etiquetas, caso contrário ele acaba rasgando ao tentar arrancá-las.
Outra característica é pegar todas as suas revistas e fazer uma fileira extremamente organizada de um canto a outro da área, ou picar folhas de tamanhos quase iguais, para as decorações do tapete da semana santa, considerando sua dificuldade de coordenação motora fina. Ou quando vamos ao supermercado e ele decide colocar as compras nas sacolas. Cada item em uma sacola. Ou no seu hiper foco sobre os santos da igreja. Tenho certeza que o seu conhecimento sobre santos deve ser maior que de muitos padres da igreja.
Hoje ele tem 19 anos, essas habilidades servem para ter uma conversa legal com pessoas religiosas. Caso ele não esteja vivendo um momento de frustração, é a pessoa mais sedutora que já conheci. Mas se for num momento de crise torna-se bem difícil acalmá-lo.
Meu desafio diário é em todas as situações que podem alterar seu humor, encontrar uma solução de negociação. No momento atual, minha principal moeda de troca é o uso do celular.
Nem pense, caro leitor, que isso é uma tarefa fácil. Estabelecer regras de comportamento para o convívio diário, consolidar estes comportamentos e lhe possibilitar melhor desenvoltura no convívio social. Por isso, recorri a ajuda de um terapeuta ocupacional. Eu preciso de ajuda.
Quanto mais rápido acontecer o diagnóstico do autismo, mais fácil será implementar os cuidados necessários para o seu desenvolvimento. Como uma equipe de profissionais que atendam nossos filhos e esse atendimento precisa ser estendido a nós, mães, pois precisamos ser cuidadas. Nosso mundo vem abaixo, nossos conhecimentos tornam-se obsoletos. Perdemos o prumo e se não formos assistidas, passamos a somatizar em nossos corpos várias doenças.
Também passamos a ter nossas crises emocionais. A vida que nossos filhos vivem, para eles é normal. Mas enquanto mães, e conhecedoras do quanto a sociedade pode ser massacrante e destrutiva com os seres humanos, sofremos na busca de construirmos hábitos que os tornem capazes de serem aceitos.
Em um texto recente, precisei me convencer com provas irrefutáveis que meu filho Pedro Henrique é feliz. Porém entendo que a maioria das ações que o deixa feliz sou eu enquanto mãe a proporcioná-las. Mas no momento atual, já vivo meio século de vida. E depois como será?
Quem irá levá-lo a igreja, mesmo não estando afim de ir?
Quem o levará ao cinema super afim de assistir o novo lançamento e se ele tiver medo, sair do cinema vinte minutos depois, na maior vontade de continuar assistindo?
Quem o levará ao mar e cuidará dele o tempo inteiro tendo apenas alguns vislumbres da beleza do lugar?
Quem, após fazer um super almoço, os amigos terem chegado, irá querer voltar ao fogão para fritar um ovo, pois naquele dia ele quer comer apenas arroz branco e ovo frito?
Quem vai parar tudo que está fazendo, para ler uma história, tantas vezes lidas que você já sabe de cor, mas ele quer que seja lida?
Sei que tem muitas pessoas autistas num grau leve que conseguem levar uma vida normal, outros quase normal e aqueles que precisam serem cuidados o tempo todo. São estes últimos que mais me preocupam.
O que os governos estão fazendo, para quando os pais não tiverem mais condições de cuidarem deles?
Para os mesmos continuarem recebendo cuidados e tratamentos com qualidade, equidade e compaixão?
Olho para todos os lados em minha cidade, com olhos arregalados, para esquadrinhar cada canto e ainda não vi nenhuma instituição, que me permita dizer aqui meu filho ficará bem, quando eu partir…
É muito bom saber que hoje é um dia que a sociedade, parou para ver nossos filhos, há eventos por todo o País, podemos postar vídeos de nossos filhos nas redes socias e receberão algumas curtidas e compartilhamentos.
À luz de todas essas manifestações de reconhecimento e respeito, devemos lembrar que eles são autistas e seres humanos, os outros 364 dias do ano, e por toda uma vida.
Precisamos de políticas públicas que cuidem de nossos filhos e, de nós enquanto mães e pais cuidadores, pois também precisamos ser cuidados. Aquela mãe que fica em casa cuidando o tempo inteiro precisa de um salário, para manter a dignidade.
Ressalto ainda, as habilidades de percepção e sentir de nossos filhos. Pois, nós para cuidarmos deles, também desenvolvemos essas habilidades. E, sentimos em demasia, o desamparo e a falta de compaixão da sociedade.
E infelizmente vivemos numa sociedade dos discursos pois é mais ou menos fácil fazer um discurso, mas daí a tornar o discurso efetivo…
Oi prima, passando aqui deixar um abraço para você e sua comadre e claro, um forte abraço no Pedro…tenho 3 filhos autistas, que ainda não falam e me preocupo muito como será o amanhã deles…Deus nos de forças e nos proteja nesta caminhada
Fábio Divino, Seus desafios são grandes. Quando meu filho ele era um ser prefeito e frágil. Quando olhei para ele sabia que faria qualquer coisa para ele ser feliz. Mas aprendi ao longo da caminhada que por mais que a gente queira não consegue sozinho atender todas as demandas que um filho especial precisa. Talvez o conselho que eu possa dar seja aceite toda a ajuda que seus familiares puderem dar na ação de cuidar. Sugiro também que você e sua esposa aprendam a tirar momentos para descansar, para se reabastecerem. Pois ao cuidarmos 24 horas por dia, todos os dias da semana e todos os meses do ano. Podemos ficar exaustos e doentes. E o nosso cuidado corre o risco de perder a qualidade que eles precisam. Sei que é difícil nos afastarmos por algumas horas de nossos filhos pequenos. Entretanto, nós precisamos nos mantermos saudáveis para conseguirmos cuidar deles, durante toda a nossa existência. E quando temos filhos especiais desejamos ter vida longa.
Um abraço cheio de coragem para você, sua esposa e seus filhos.
Cícera
é realmente um grande desafio Cícera e é tão necessário o apoio, que muitas vezes não vem…
Primo, eu não tenho a sua vivência ou a de Cícera, minha amiga e comadre… o que sei é que tanto os seus filhos quanto o dela, Pedro, meu afilhado, estão recebendo todo o carinho dos pais e, talvez hoje isso seja exatamente o que eles precisam, mas sei também que a preocupação com o futuro é um item bem presente na vida dela e na sua também, então o que resta é tentar lutar por mais e melhores políticas públicas, reais, para além de todos os discursos que ouvimos a toda hora.
Precisamos que as pessoas tenham um olhar mais atento e práticas mais humanizadas para com o diferente.