“Enquanto me foi possível mirar a face múltipla da velhice, posso falar de um ‘Admirável Mundo Velho’, procurando o repicar de sinos, ora alegre, ora triste, do entardecer”. (BARRETO, 1992, p. 10)
Em uma obra dedicada a analisar a velhice e suas representações, a recolher depoimentos e a incentivar exercícios de “como me vejo velho”, a autora retrata um panorama da velhice brasileira no começo dos anos 1990, que infelizmente permanece atualíssimo 33 anos depois.
Há o agravante de que hoje, o número de velhos/ idosos aumentou muito e que hoje se fala em uma população de velhos e de muito velhos, numa sociedade que cada vez mais valoriza o novo, a novidade, a beleza, e promove o ideal da eterna juventude, custe o que custar. Segundo a autora, há a ideia de que “(…) A velhice é uma realidade incômoda” (BARRETO, 1992, p. 19).
O que permeia os depoimentos e exercícios de como os entrevistados se vêem, de como se visualizam a cada década, é o medo da dependência física, da perda da beleza, especialmente no caso das mulheres, da perda da funcionalidade do corpo, do abandono, da solidão, da repressão do isso pode ou isso não pode na sua idade, da violência, das agressões, da espoliação da vontade e do patrimônio e, até mesmo da violência sexual.
Há ainda, o medo de que se vejam enganados pela família e encerrados dentro de asilos, sem receberem visitas, abandonados à própria sorte e ao cuidado de estranhos.
Segundo a autora, a velhice é o tempo vivido, concreto, tempo real. Essa era a realidade da velhice brasileira em 1992. Essa é a realidade da velhice brasileira hoje, 2023. Qual será a velhice brasileira daqui a 33 anos?
O velho não é mais visto como sábio. O velho hoje é visto como alguém que deixou de se cuidar e não se enquadra nos parâmetros da beleza, do aceitável socialmente. Se a velhice é associada a um corpo disfuncional, cheio de marcas que a passagem do tempo registra, é cobrado de todos que evitem isso.
O que fazer? Que caminho seguir? Lutar para parecer jovem porque é obrigado a isso? Lutar para ter o direito de ter direitos a ser velho? Admirável Mundo Velho continua atual na proposição das reflexões necessárias sobre nossos velhos e sobre nós mesmos.
São as histórias de Alaídes, Aline, Amélias, Ângelas, Antoninos, Célias, Cristianos, Das Dores dos Santos, Esperanças, Franciscos, Geraldos, Giselles, Heitores, Helenas, Idalásias, Joões, Julianas, Junes, Lus, Lucas, Luízas, Manueis, Marcos, Marias, Aparecidas, entre tantas outras histórias que foram apresentadas, imaginadas, vividas.
Mas poderiam ser as minhas histórias, as suas, as de alguém que você conhece.
Esse livro é fundamental para que se possa ler, conhecer, refletir e pensar: qual é a velhice que eu espero e como trato a velhice ao meu redor?
BARRETO, Maria Lecticia. Admirável Mundo Velho: Velhice, fantasia e realidade social. – São Paulo: Editora Ática S. A., 1992. 237 pp.
Autora do texto: Kelem Cristina Sene Santos
Recomendo a leitura a todos.
Obrigado prof. Cícera, Preciso ler este livro, estou próximo desta faze, na verdade estou com os dias contados para entrar nela, para mim só faltam 5 mil e 400 dias. Se tenho que fazer algumas coisas pelos velhos devo fazer agora por que logo logo vou precisar que alguém faça por mi.