No geral, nosso tempo é tão limitado, enquanto cuidadores, que nos privamos de uma série de ações que tornariam nossa vida mais fácil. Há anos tento construir essa facilidade e leveza, necessárias para viver com equilíbrio todas as fases do cuidado. Porém, há experiências que nos deixam fragilizadas.
E, quando pensei que estava a remar um barquinho por águas tranquilas com Pedro, e que podia atracar em qualquer praia mundo afora e viver uma vida sem atropelos, cheguei a ver a praia, apreciar a areia branca, olhei os pássaros a voar no céu e senti o cheiro da brisa.
Então sobreveio um temporal, e meu barquinho, que estava prestes a alcançar a praia, de repente se viu no olho de um furacão, chamado convulsão, seguido de desmaio. Cuidamos de nossos filhos, mas quando eles estão em perigo e nos falta força física para amenizar a situação, nos sentimos impotentes, incapazes e sem saber qual a melhor forma de agir.
Eu queria chorar, porém sabia que não era o momento, tive vontade de gritar, mas não resolveria nada. Pensei também em ligar para os bombeiros ou chamar o vizinho. Entretanto, não conseguia me afastar de Pedro. Então o mantive de lado e observei sua língua. As únicas coisas que sabia ser essenciais naquele momento.
Quando ele saiu da crise, eu o levei para o pronto socorro, as únicas coisas que indicavam que ele não estava bem eram o desânimo e a palidez, sintomas sem importância numa Unidade de Pronto Atendimento, onde na maioria das vezes as pessoas chegam quebradas, enfartando ou carregadas por outra pessoa.
A médica que o atendeu deu um encaminhamento com urgência para o neuro, o que não fez muita diferença, pois no dia seguinte após pagar pelos exames de sangue para agilizar qual era o motivo da crise, fui informada na secretaria da saúde, que não tinha vaga.
Então uma das orientações que deixo aqui para as mães é a de quando seu filho convulsionar, desmaiar ou tiver alguma quebradura chame os bombeiros. Com um pouco de sorte, eles o levam direto para o hospital.
Entre um acontecimento e outro, também descobri que não sei receber elogios.
Porque quando peguei o resultado dos exames de sangue e consegui um encaixe no PSF do bairro, o médico perguntou quando tinha sido sua última crise e eu informei que foi em 29 de outubro de 2020, fui parabenizada por Pedro Henrique ter passado todo esse tempo sem crise.
Eu recusei o elogio, pois na minha cabeça naquele momento, se estou cuidando e dando a medicação conforme a prescrição do neuro, não era para ter nenhuma crise.
Depois em casa, fiz as contas e compreendi que 3 anos e 357 dias é um longo período. É o reflexo que meu filho é bem cuidado.
Finalmente entendi, que a rotina do cuidado me deixou com um grau de exigência tão elevado, que me tornei insensível a receber elogios.
Então, neste momento, agradeço ao médico por seu gentil e reconhecer o meu esforço na caminhada.
E para todos que adoram dizer para uma mãe atípica que ela é “guerreira” ou que “Deus dá a lã conforme o carneiro”, informo que: quando temos um filho diferente, precisamos ter Políticas Públicas que atendam às necessidades de nossos filhos e, como mães atípicas também precisamos ser cuidadas.
É preciso estar atento ao fato de que em situações assim, mães atípicas se desestabilizam e também adoecem.
Com o agravante que na maioria das vezes ela não tem com quem deixar o filho, para cuidar da sua própria saúde.
Nós ansiamos pelo despertar da aquelas pessoas que são responsáveis pelas políticas públicas!
Cícera não é fácil cuidar de alguém sem nos esquecermos. Parabéns pelos cuidados com seu filho. Cuide-se. bjs